No finalzinho de novembro, li O jovem, o livro mais recente de Annie Ernaux. E, junto com O acontecimento, ele se tornou um dos meus preferidos da autora. Não à toa. Os dois estão conectados. Ernaux conta logo nos primeiros parágrafos que se sentiu impelida a começar a relação com um estudante 30 anos mais jovem porque “queria encontrar, na sensação de cansaço e desemparo de depois, motivos para não esperar mais nada da vida” e, assim, desencadear o processo de escrita de um livro que “hesitava em fazer por causa de sua dimensão”. O livro é justamente O acontecimento, que vai ganhando força conforme lembra de suas origens por meio da juventude do amante. Ele representa a vida que Annie levava antes de ascender à classe intelectual. A linguagem, os gestos. Tudo nele faz com que ela perceba o caminho que percorreu, o lugar de onde se distanciou. E a também a carrega de volta para um dia nos anos 60 em que fez um aborto clandestino. O jovem mora em frente ao hospital onde ela foi internada por seis dias por causa da hemorragia que se seguiu ao procedimento.
E quando a vontade de narrar o que se passou chega ao ápice, o relacionamento entre eles termina.
“Quanto mais eu avançava na escrita desse acontecimento que tinha se passado antes mesmo do nascimento dele, mais sentia um desejo irresistível de terminar com A. Como se eu quisesse liberá-lo e expulsá-lo, assim como eu tinha feito com o embrião mais de trinta anos antes.”
A biblioteca deste mês é um desdobramento do que vi e ouvi na Flip. Anotei as dicas de leituras de três autores e, coincidentemente, os títulos conversam entre si. São histórias de explorações, de viagens — internas ou externas.
Benjamín Labatut citou três livros que me chamaram a atenção, mas infelizmente não encontrei traduções para o português: The peregrine, de J.A. Baker e In Patagonia, de Bruce Chatwin, e An Elemental Thing, de Elliot Weinberger. Lendo a sinopse de cada um, notei que são, de certa forma, narrativas não convencionais, bem ao estilo de Labatut.
Nastassja Martin não mencionou livros específicos, mas falou em Bruno Latour e Hannah Arendt. Então, deixo aqui títulos desses dois autores que eu tenho muita vontade de conhecer: Homens em tempos sombrios, de Arendt, e Onde aterrar?: Como se orientar politicamente no Antropoceno, de Latour.
E Tamara Klink indicou apenas um, o preferido dela sobre viagens e adaptação à linguagem: Budapeste, de Chico Buarque.
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Para quem não conseguiu acompanhar a cobertura da Flip, deixo aqui as edições que foram enviadas antecipadamente para os apoiadores:
Queria ser grande, mas desisti
EXTRA #9 - Queria ser grande na FLIP
EXTRA #10 - Queria ser grande na FLIP
EXTRA #11 - Queria ser grande na FLIP
Queria ser grande, mas desisti também é livro \o/
E se quiser me acompanhar em tempo nada real: @babibomangelo