#61 Queria ser grande, mas desisti
Sobre fotografia e o medo do julgamento
Meu marido é jornalista, como eu, mas anda investindo pesado na fotografia. Já perdi a conta de quantas vezes fui convidada a posar para que ele pudesse treinar alguma técnica nova. A resposta: não, muito obrigada.
Nas poucas vezes em que topei, fiz caras e bocas com um quê de má vontade, rindo da situação e de mim mesma. Não era uma risada de quem estava se divertindo, mas, sim, de autodepreciação. Daí o resultado não podia ser outro: eu odiava absolutamente todas as fotos. Era o nariz que estava torto demais, a cabeça num ângulo estranho e os olhos de peixe morto.
O Leandro enxergava de outro jeito. Ele gostava de algumas e queria postá-las. JAMAIS!
Poxa, as pessoas iam me achar ridícula. Quem sou eu para ficar aparecendo dessa forma?
Veja bem, eu não sou totalmente avessa a fotografias. Minhas fotos costumam ser espontâneas, ao lado dos amigos, do Joca. Acho que só na gravidez me permiti ousar mais, caprichar na produção e surgir sozinha nas imagens. O obstáculo pra mim é me levar a sério, deixar claro que posei para aquela foto com o intuito de me achar bonita e que publiquei porque realmente gostei do resultado.
Mas eis a virada na história...
* tcham tcham tcham tcham *
O Leandro fez um workshop dia desses com foco em direção de modelos. Uma moça bem linda posou no metrô, com uma galera olhando, e não demonstrou nenhum pingo de vergonha ou insegurança. Eu amei aquelas fotos e me senti inspirada por aquela pequena demonstração de coragem.
No fim de semana seguinte, meu fotógrafo particular propôs mais um ensaio e eu topei. Sugeri irmos pra Paulista, no Instituto Moreira Salles. Lugar cheio de gente. Lotado de pessoas que ficariam me vendo lutar para encontrar a postura e a expressão mais bacana.
Começamos devagar, comigo ainda rindo de nervoso, mas fui me convencendo do real papel daquela plateia que estava por ali. Eram todos estranhos, rostos que eu nunca mais encontraria. Anônimos que poderiam me achar infantil, narcisista, uma vítima da própria imagem. E daí? Por que a opinião deles deveria importar para mim? Não deveria e não iria.
No fim, eu me diverti pra caramba. Fiquei muito satisfeita com o exercício de vulnerabilidade, de me permitir gostar de mim mesma, de fazer carão. As fotos ficaram lindas, mas o processo é que deixou marca, sabe? E foi especialmente importante fazer esse ensaio depois do nascimento do Joca. A maternidade muda nosso corpo, mas, acima de tudo, altera pra sempre a nossa alma. E eu consigo enxergar a transformação em cada fotografia.
Uma das melhores leituras das últimas semanas foi essa entrevista com a monja Jetsunma Tenzin Palmo. Ela fala sobre a posição da mulher dentro do budismo e de como se abrir para ouvir opiniões diferentes das nossas. Eu gostei especialmente deste trecho aqui:
Vivemos uma poluição material enorme; ar, terra, água poluída. Se a gente pudesse ver a energia de raiva, violência, paranoia, ganância, inveja, competitividade ao redor da terra, seria uma grande camada de energia suja. Então, é muito importante que a gente não aja a partir dessa energia, mesmo que estejamos indignados. Indignação baseada em raiva em vez de compaixão apenas adiciona mais disso ao mundo, além de medo. Como o Buda diz: “A raiva não é solucionada com mais raiva; a raiva é solucionada sem raiva”. Então, temos que colocar para fora amor e compaixão, porque o mundo está realmente sofrendo. E isso não significa que aceitamos e toleramos. Mas, se nos unirmos a essa energia de paranoia e medo, estaremos do lado deles, como em Star Wars.
Você conhece a iniciativa Mulheres que escrevem? Trata-se de um grupo empenhado em divulgar o trabalho produzido por vozes femininas. Tudo começou com uma newsletter, se espalhou para o Medium e agora a novidade é um podcast. O primeiro episódio traz a leitura do texto Eu não preciso ser feliz, publicado em 2016, mas que continua incrível.
Ainda sobre escrita, indico fortemente que você ouça essa entrevista da Maria Ribeiro para a rádio CBN. Ela falou bastante do novo livro Tudo o que eu sempre quis dizer, mas só consegui escrevendo. Deu vontade de comprar ;)
A patrulha do peito voltou :(
Como recuperar a autoestima
Como abandonei o ativismo na internet - sobre o poder de transformação do feminismo, mas também das amarras do movimento
Três palavras para uma infância mais livre e curiosa - em inglês
E esse livro de educação sexual para crianças? Mais sincero e direto impossível ;)
Uma dica de podcast: Dear Sugars. Estou viciada nos conselhos dos escritores Cheryl Strayed e Steve Almond. Eles recebem questões extremamente íntimas dos ouvintes e dão palpites carinhosos para ajudá-los
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