#60 Queria ser grande, mas desisti
Você conversa sobre religião com seus amigos e colegas de trabalho?
Esse não é um dos tópicos mais populares na bolha que eu frequento. Nas vezes em que abordamos a questão, o tom quase sempre é de crítica - dos conceitos tortos que alguns grupos propagam, da resistência à diversidade, da crença cega de algumas pessoas.
Eu sou uma dessas vozes de crítica, mas ao mesmo tempo eu tenho muita fé, e em muitas coisas. Tenho fé em Deus, na força do pensamento, no poder do amor. Mas vejo que há pouco espaço para falar sobre isso.Temos vergonha de nos expor? De parecer ingênuos ou bregas? De causar alguma discussão? Medo de nos encaixarem num determinado perfil que não desejamos?
Para mim, a resposta é uma mistura de todos esses pontos. Por isso, resolvi falar sobre o tema nesta carta. Vamos lá?
Eu fui criada em três religiões: a família do meu pai é católica, a da minha mãe é evangélica e a do meu padrasto é espírita. Durante as férias, eu me dividia entre aulas da escola dominical e espiadas clandestinas em sessões de pintura mediúnica. Meus pais sempre me deixaram livre para experimentar da forma que eu achasse melhor.
Por proximidade, me aprofundei mais no espiritismo. Minha mãe e meu padrasto fazem parte da equipe que administra um centro aqui em São Paulo. Fiz um curso, mas não fui além disso. Percebi que não tenho aptidão para ser frequentadora assídua. Gosto dos conceitos, das discussões, mas acompanhar à distância, e por outros meios, me serve muito bem.
Então, como a minha fé se manifesta? O tempo todo. Eu acredito que ter fé em algo além do que se vê, que nos protege e nos guia para o caminho do bem, pode realmente nos manter em sintonia com atitudes positivas - para gente e para os outros.
Tem fases em que rezo bastante - para Deus, para meu pai, para o universo - e outras em que o sentimento está ali quietinho, dormindo, mas nunca ausente. Nos últimos anos, o que predominou foi o segundo comportamento. Até que passei por uns perrengues. Nada como o medo para nos fazer questionar e voltar às nossas origens, não é mesmo?
Eis a sucessão de fatos que me perturbaram:
- Tive um sangramento considerável nas primeiras semanas de gravidez e precisei ficar 10 dias de repouso - sem saber ou poder fazer nada para garantir que aquela miudeza se agarraria ao meu útero;
- E, já no terceiro trimestre, um dos ultrassons apresentou uma alteração preocupante no cérebro do Joca - algo que poderia se transformar em hidrocefalia. Não dava para ter certeza antes do nascimento. Ou seja, mais uma vez nada podia ser feito por mim.
Se existe algo mais detestável do que não estar no controle das coisas, eu desconheço. Enfrentar essas duas situações me consumiu. A primeira logo se resolveu, mas a segunda me abalou de uma forma que jamais experimentei.
Li tudo o que pude sobre o assunto e os possíveis cenários me assustaram. Chorei muito. Muito mesmo. Pra caramba. Até minhas lágrimas acabarem. Daí resolvi que iria encarar aquilo de outro jeito. Então, rezei. Todas as noites. Pedi pra que aquela alteração sumisse ou para que eu tivesse forças para receber o Joaquim do jeito que ele viesse. Aquele era meu filho e eu o amaria com força, com qualquer necessidade especial.
Minha avó, que é médium, me ligou nos primeiros dias depois daquele fatídico exame. Ela tinha uma mensagem da equipe do doutor Bezerra de Menezes: aquela dilatação no cérebro do Joca iria voltar ao normal, era uma questão de tempo. Eu me apeguei tanto a isso. Tanto. Eu imaginava aquele troço desinchando, diminuindo, voltando ao padrão.
Nos exames seguintes, nada de diminuir, mas também nada de aumentar. Boa notícia. Continuei visualizando a melhora. Rezando sempre pelo meu bebê e pela minha sanidade mental. Daí, por volta do nono mês, os números começaram a jogar a meu favor. Uma leve reduzida aqui, outra lá. Até que no último ultrassom veio o parecer do médico: "não consigo ver mais nenhuma alteração aqui".
Nenhuma alteração. Nenhuma. Nenhuma. Nenhuma.
Os médicos não sabem dizer o que causou aquela situação e nem o que fez com que ela desaparecesse. Eu quero, e vou, acreditar que minha fé, e também a da minha família e de amigos, contribuiu muito para isso <3
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