Ilustração de Azra
e se eu parar de procurar por outras impressões sobre livros e filmes assim que eles acabam? porque é isso que eu faço: chego à última página, ao último frame e saio em busca de entrevistas, bastidores. santa internet. tem de tudo, aos montes. e sacia minha vontade de estender a história que acabei de experimentar. ela terminou na teoria, mas não dentro de mim, sabe como é? gostoso demais me jogar numa obsessão temporária e cultural. só que junto com esse pacote de paixão vêm as avaliações. infinitas. as mais distintas possíveis. e de repente, aquilo que me bateu de um jeito feliz ganha camadas e camadas de interpretação. uma avalanche de contorcionismos teóricos. alguns ótimos, alguns tortos, alguns exagerados, alguns pingando veneno. quando abordam raízes racistas, homofóbicas e misóginas, show. é importante saber, questionar e gritar contra. eu me junto ao coro com prazer. mas aqui estou falando de obras sem grandes questões controversas. estou falando daquele livro que você terminou esses dias e te arrebatou, que te deixou pensando por dias nos protagonistas. daí você acaba a leitura, encontra essa montanha de conteúdo online e a sensação de deleite passa a dar espaço para aquela perguntinha existencial: será que eu li tão errado assim? deixei escapar essas falhas terríveis de estrutura e construção de personagem que aquele crítico apontou? a mensagem final deixou a desejar? qual era a mensagem esperada??? não sei. NÃO SEI. e veja bem, eu adoro discutir sobre livros, filmes, podcasts. é nessas horas que agradeço por ser tagarela e desinibida. e por ter muita opinião, como diz minha mãe. é o que faço aqui, de certa forma — construo textos e vídeos com comentários a respeito do que vi e li. então, o que está me incomodando exatamente? talvez sejam os debates que caem num discurso hiper racionalizado que nem parece que estamos falando de arte? ou a correria que as redes impuseram para que se chegue logo a uma conclusão se aquilo realmente vale a pena, se pode ganhar mesmo o selo de uma boa obra, como se fosse fácil assim, como se não fossemos múltiplos? pode ser. ou talvez tenha ligação com o cansaço particular de escrever páginas e páginas de uma dissertação em que eu mesma preciso acrescentar camadas e camadas de teoria sobre um romance que eu poderia resumir assim: BOM DEMAIS, VIREI A NOITE LENDO, RECOMENDO.
deixo vocês com um trechinho do sempre atual de Contra a interpretação, de Susan Sontag, na tradução de Denise Bottmann:
Ninguém jamais conseguirá reencontrar aquela inocência anterior a toda teoria, quando a arte não precisava justificar a si mesma, quando não se perguntava o que uma obra de arte dizia, porque se sabia (ou se pensava saber) o que ela fazia. A partir de agora e enquanto existir a consciência, estamos presos à tarefa de defender a arte.
Eu gosto mesmo é de um equilíbrio entre análise crítica e coração pulsando, aqueles textos com alma, com elementos pessoais. Porque, né, interpretação é isso — uma visão particular, jamais definitiva ou totalizadora. Alguns exemplos:
os ensaios da — ela mandou a crítica de Babygirl para os apoiadores ontem e, olha, é 10/10
as resenhas da — sempre delicadas, empolgadas e costurando outras leituras e referências
as edições da , da Luisa Manske — uma das newsletters que leio assim que batem na minha caixa de entrada <3
os posts da Paula Jacob, tanto de filmes como de livros
os vídeos que a Dayhara Martins tem publicado no canal dela no Youtube, indico começar com Masculinidades em O avesso da Pele, de Jeferson Tenório
Adorei a lista de melhores do ano (em inglês) que a montou com a escolha de QUARENTA E CINCO amigos
Uma dica de leitura para o começo de 2025: Mar da tranquilidade, de Emily St. John Mandel e tradução de Débora Landsberg. Seguindo o tom desta edição, vou me resumir a dizer BOM DEMAIS, VIREI A NOITE LENDO (de forma bem inconsequente para quem tem dormido umas cinco horas por noite), JÁ COMECEI OUTRO DA MESMA AUTORA (The Glass Hotel), RECOMENDO \o/
Eu deixei de ser modesta: uma carta para todas as mulheres que desejam muito
Qual o próximo grande momento?
O que você aprende quando continua
As pessoas nem sabem que mudam as nossas vidas
Millennials e a sensação de estar perdido num mundo nem tão belo
Como as comédias românticas nos iludiram sobre o que é ser uma mulher jornalista — lendo esse texto percebi o tanto que fui influenciada por essas figuras da ficção. Ainda amo ser jornalista, mas a rotina e a pressão são bem diferentes do que pintaram (como tudo, não é mesmo?)
Eu quero jogar meu celular na água
Você acredita na vida pós-likes? (em inglês)
Longe de mim romantizar o cansaço
Semana passada, enviei para os apoiadores um GUIA DE SOBREVIVÊNCIA PARA A ESCRITA DE PROJETOS LONGOS
E liberei para todos o acesso ao vídeo com as respostas às perguntas mais frequentes — os apoiadores receberam antecipadamente, no mês passado:
Queria ser grande, mas desisti também é livro \o/
E se quiser me acompanhar em tempo nada real: @babibomangelo
Babi, a faculdade de Letras me tornou uma maluca por opiniões. Terminava qualquer leitura e ia correndo buscar pessoas que falavam qualquer coisa sobre a obra, e caía sempre no mesmo buraco do "será que não entendi nada? que li tudo errado?" eu estava ficando maluca, ler deixou de ser divertido e passou a ser uma obrigação. Depois de um tempo comecei a separar as coisas e buscar opiniões apenas quando a leitura era algo relacionado ao mundo acadêmico, e é uma libertação danada! Eu não quero saber TODAS as interpretações sobre um livro que eu simplesmente li e gostei, às vezes gosto de guardar apenas o que eu senti sobre um livro que me tocou, sem me misturar.
Não posso negar que sair procurando todo o tipo de análise/comentário é o que eu mais gosto quando termino de ler/assistir algo. Fico empolgadíssoma! Vez ou outra a gente acaba levando uma pedrada de decepção mesmo, mas o que talvez seja útil pra evitar algumas crises é tentar imaginar uma caixinha/um lugar para cada coisa, um lugar para o que senti quando assisti, um lugar para o que descobri e outro lugar para o que refleti em cima de tudo. Sem deixar que uma caixinha esmague a outra, sabe? Cada leitura vem de um ponto de vista, de um momento específico, dentro de um contexto que fazia sentido ali com a bagagem (incluindo a emocional) que eu tinha até então. Assim sinto que não estou perdendo nada, só somando.