Ilustração de Josefina Schargorodsky
Tenho uma lista mental das invejas que sinto dos homens. Um dos itens: andar pela rua sem o medo onipresente da violência sexual. Outro: envelhecer e não ouvir comentários diários sobre procedimentos estéticos. Mas nessa lista tem sempre um ponto ausente, uma característica que mora na coluna dos grandes prós de ser mulher: a dinâmica de nossas amizades, em especial o mecanismo FALADO dessa relação. Não que os homens não conversem entre si. Conversam, mas não como nós. Não de forma tão extensa, tão constante, tão vulnerável. Ontem, recebi um vídeo no qual Michelle Obama diz que poderia passar DIAS conversando com as amigas. Não é um exagero. Há assunto para tudo isso. E se não houver, a gente inventa, repete, reorganiza. Citada com frequência por Elena Ferrante, a filósofa Adriana Cavarero explora bastante o que chama de “caráter narrativo das amizades femininas”. É dela a frase “eu conto a você a minha história para que você a narre para mim”. Ou seja: eu falo de coisas que me aconteceram, de pensamentos que me rondam para que depois você narre de volta para mim, ou para outras. E nesse processo de contação de histórias, algo é destravado, superado. É o reconhecimento de quem sou em outra como eu. É intenso. Perturbador, às vezes. Sempre transformador. E esse caráter narrativo cutuca ainda mais camadas quando a amizade une mulheres que são escritoras, que vivem contaminadas e impelidas pela literatura. É assim com amigas queridas que me acompanham desde a faculdade. Se impresso num rolo de papel, nosso grupo de mensagens daria a volta ao mundo. Perrengues de trabalho misturados a crises existenciais, com troca de textos para cada uma ler e palpitar, com depoimentos de aulas bacanas que assistimos, técnicas de escrita que acabamos de descobrir. Quando parece que o fluxo se esgotou, nos encontramos para almoçar e o falatório volta num turbilhão. Planos de viagens são feitos, planos para mais conversas, para um fim de semana inteiro de papo. É a narração da vida, das experimentações, dos desejos, das angústias. Uma narração coletiva, entrelaçada. Emancipatória.
Elena Ferrante menciona o trabalho de Adriana Cavarero no livro As margens e o ditado <3 Eu já tinha esbarrado nas ideias dela no ensaio Heroínas puras, de Jia Tolentino, publicado na coletânea Falso Espelho:
A identidade, segundo Cavarero, não é algo que possuímos de forma inata e então revelamos, mas algo que compreendemos por meio das narrativas que nos são fornecidas por outras pessoas. (p. 155)
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Queria ser grande, mas desisti também é livro \o/
E se quiser me acompanhar em tempo nada real: @babibomangelo
Bárbara, esse texto me pegou no íntimo, de verdade! Tenho algumas amigas muito próximas, compartilhamos tudo e é inclusive algo que meu marido vez ou outra brinca, quando me acontece algo ele diz "já vai contar para as meninas" hahahha porque ele não entende, não teria como, é algo muito singular do ser mulher, penso eu. Obrigada pelo texto!
Vamos publicar o livro da Cavarero na Bazar. Em breve! ❤️❤️