Palavras constroem imagens e uma das mais fortes que guardei da leitura de Poeta Chileno são as casas móveis da Ilha de Chiloé. Lares que se mudam por causa de separações ou de oportunidades melhores. Dispostos em palafitas na água ou em terra firme. Basta a vontade - e o esforço - e lá se vão telhados e paredes, puxados por lanchas ou por bois.
— [...] É como uma casa com patas. Então uma coisa é o terreno, e outra coisa é a casa. E se um casal se separa, às vezes um fica com a casa e o outro com o terreno.— E como carregam a casa?
— Ajeitam a casa em cima de uns troncos grossos e põem uns bois pra puxar. Chamam essas mudanças de “puxadura de casa”. E quando precisa levar uma casa de uma ilha pra outra, eles juntam os troncos formando uma balsa e puxam tudo com lanchas. É bonito. A casa navegando entre as ilhas. E além de tudo é prático, não precisa nem esvaziar as gavetas. Mas, mesmo assim, precisa tirar os quadros das paredes, porque podem cair.
— E as pessoas se separam muito em Chiloé?
— Não muito, mas às vezes você quer ir morar mais perto dos seus filhos ou netos, então arruma um terreno e leva a casa. É bom saber que sua casa não está grudada na terra. Que serve pra terra e também pro mar. É bom a casa ter patas, todas as casas deveriam ter patas.
Poeta Chileno, de Alejandro Zambra
Descobri que a puxadura de casa é chamada de minga - palavra que descreve o ato em si, mas também a união da comunidade para ajudar um dos seus, sem nenhum pagamento envolvido. Tem muitos vídeos por aí e até um documentário sobre a mudança de uma igreja. Enorme. E que, ao caminhar pelo vilarejo, deixa a impressão de que levita.
Essa ideia de uma casa itinerante, a tiracolo, me toca bastante. Como boa canceriana, preciso de tempo no meu próprio espaço. Vejo como refúgio, mas também como fonte da energia necessária para a vida de fora. Gosto de ir para o mundo, mas com a garantia de ter um lugar para o retorno. Com o meu cheiro, meus livros, meus amores. Ao ler o trecho acima, passei dias pensando como seria carregar meu lar por aí. Não só durante mudanças pontuais, mas sempre que precisar de segurança.
Lembrando que Zambra é um dos autores confirmados na edição virtual da Flip, que começa no final de novembro \o/
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O sonho de ser caracol, ter a casa nas costas e levar ela para todo lugar. Mais uma edição linda 😍
lendo as palavras suas e de Zambra, me lembrei da cena do filme Up, altas aventuras; a casa voando com um balão amarrado. Amaria carregar minha casa por ai, ao menos o lar traria o tom do conhecido, palavra de quem acabou de vir morar em sp saindo de Recife.