#155 Queria ser grande, mas desisti
Ilustração: June Jewell
"Teve sete filhos. Três homens e quatro meninas. Seu gosto pela vida, sua risada larga, sua boa vontade de servir nunca foram impedimento para disciplinar os meninos. Não tinha grito, não tinha beliscão debaixo da mesa nem vara de marmelo. Seu segredo era não gastar autoridade com não frouxo. Aprendeu com o pai. Segundo sua sabedoria discreta, para dizer um não, era preciso ter ele bem certo por dentro"Tudo é rio, Carla Madeira
Não gastar autoridade com não frouxo. Tenho poucas certezas na maternidade, mas essa é uma delas. Se Joca quer misturar suco de uva com o de tomate, por que dizer não? Tirar todas as almofadas do sofá para depois pular nele? Vai nessa. Dormir mais tarde porque está gostando de ver o filme? Problema algum. Comer ovo de páscoa antes do almoço? Poxa, isso acontece pouquíssimas vezes ao ano. Prefiro guardar os nãos para quando eles realmente importam. Aqui em casa NÃO pode bater, NÃO pode tratar mal, dizer coisas feias um pro outro. Se algo assim acontece, não economizo na dureza da voz e nem na paciência para explicar os motivos da bronca. Desse jeito, sou fiel a mim mesma. Ouvi muitos nãos sem propósito e achava um saco. Prometi que faria diferente. Daí tamanha identificação com Aurora, grande personagem do livro Tudo é rio, de Carla Madeira. Uma mãe amorosa, atenta. Maleável, mas firme quando necessário. Uma inspiração. Não só ela, o livro todo. Ô escrita bonita, com frases que te fazem parar e absorver o impacto. Recebi indicação de tanta gente. Estavam todos certos.
De 2015 pra cá, depois do movimento #leiamulheres, vi o perfil das minhas leituras mudar. Passei de 75% de autores homens para um equilíbrio de quase 50%, em 2020.
No começo, fiz escolhas ativas: olhei para a lista de desejos e acrescentei títulos de mulheres. Descobri tanta gente interessante, tantos temas que me tocavam. Elas estavam lá, escrevendo pra caramba, tanto quanto os homens, mas não eram lidas na mesma proporção. Hoje, sou impelida a essas narrativas naturalmente. Com mais demanda, há também mais atenção de editoras, de revistas especializadas. Ler é realmente um ato político.
Estou contando tudo isso porque algumas coisas seguem paradas no tempo. O Guardian publicou uma reportagem esta semana com o seguinte título: Por que tão poucos homens leem mulheres?. Segundo pesquisa do Nielsen Book Research,
"para as 10 autoras mais vendidas do sexo feminino (incluindo Jane Austen e Margaret Atwood, bem como Danielle Steel e Jojo Moyes), apenas 19% de seus leitores são homens e 81%, mulheres. Mas para os 10 autores masculinos mais vendidos (incluindo Charles Dickens e Tolkien, bem como Lee Child e Stephen King), a distribuição é mais uniforme: 55% homens e 45% mulheres.".
Achei triste e limitante.
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Trecho de Beautiful world, where are you - novo livro de Sally Rooney que chega às estantes em setembro \o/
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