#107 Queria ser grande, mas desisti
Escrevo enquanto o Joaquim percorre meu computador com um grão de feijão. Ele pousa em todas as teclas e arranha a tela. Afasto como dá e acabo digitando só com um dedo. A outra mão uso para fazer cócegas ou traçar voos ousados com o feijão.
Já este segundo parágrafo está sendo redigido no bloco de notas do celular. Usar o computador virou gincana, então parti para a técnica escrita-em-pé-enquanto-anda.
Um intervalo de 2 horas para brincar com carrinhos e, agora que ele está entretido com as plantas e o regador, posso voltar ao texto. Mas qual era intenção com tudo isso? Já fugiu da minha mente. E no lugar se instalou a preocupação com o almoço. Peço algo fora ou faço aquele risoto de limão siciliano para aproveitar a fruta que logo mais vai estragar? Acho que vou na segunda opção.
Ter escolhido o risoto foi uma boa. Preciso ficar mexendo sem parar e estou meditando sobre ideias para esta newsletter. Se vou conseguir executá-las é outra questão. Tenho uma lista delas, mas as férias escolares estão melando quase todas.
Será que deveria aproveitar a soneca que ele vai tirar à tarde para gravar um vídeo sobre a leitura de grandes clássicos? Talvez seja melhor dormir também. Ou ver uma série. Ou continuar a ler Ulysses. Ou passar um tempo com meu marido, que chega do trabalho por volta das 13h. Hoje, faz cinco anos que começamos a morar juntos.
16h. Fiz um pouco de tudo que eu gostaria. Ou seja, não fiz nada direito. E tá tudo bem. A perfeição é superestimada. Agora vou ali pegar um trânsito para chegar à redação. Joca se despede com um beijo e me diz: eu te amo pá pempe. Saio cansada, mas feliz. E que agora comece o turno do Leandro, porque eu só volto de madrugada.
O texto de hoje surgiu a partir da leitura de Mulheres e ficção, de Virginia Woolf. Nesse pequeno grande livro, há uma reflexão importante sobre a baixa presença de escritoras até a década de 1930. Os motivos? A nada surpreendente falta de tempo pra si mesma e as poucas chances de ver o que está acontecendo no mundo, já que a vida doméstica limitava absurdamente a experiência de vida das nossas antecessoras.
É indiscutível que a experiência exerce grande influência sobre a ficção. A melhor parte dos romances de Conrad, por exemplo, caso ele não tivesse podido ser um homem do mar, iria por água abaixo. Retire-se tudo o que Tolstói sabia sobre a guerra, como soldado, e da vida e da sociedade, como um jovem rico cuja educação o habilitava a qualquer tipo de experiência, e "Guerra e Paz"ficaria incrivelmente empobrecido.
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